Tentativa frustrada de garrotear as redes sociais é recado de um país que não aceita mais nada de cima pra baixo; por Ivandro Oliveira

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) amargou, no dia de ontem, uma grande derrota. Mas a retirada de pauta do Projeto de Lei 2630, que trata de uma espécie de regulação das redes sociais, não foi apenas uma derrota do governo, mas dos conglomerados de comunicação e do Supremo Tribuna Federal (STF), que chegou, pasmem, a contribuir com sugestões ao controverso relatório do deputado federal Oraldo Silva (PCdoB-SP), em mais uma demonstração de que os papéis dos poderes no Brasil estão totalmente invertidos, do tipo cabeça pra baixo mesmo, que o diga Montesquieu e o seu secular princípio da tripartição dos poderes.

Lula, que está achando que pode mais do que realmente pode, deve colocar as barbas de molho, porque o país que governa é muito diferente daquele que entregou, em dezembro de 2010. Muita coisa mudou e o ambiente político não é mais céu de brigadeiro, sobretudo para o PT, seu partido, que conta com a antipatia de quase ou metade da população, que não engoliu e nunca engolirá a narrativa adubada por decisões, no mínimo questionáveis, isso para não dizer outra coisa, da Corte Constitucional do país que de uma hora para outra, resolveu demonizar a maior operação de combate à corrupção da história do Brasil, libertando bandidos, descondenando condenados, e perseguindo os mocinhos da história.

O fato é que o dabate em torno de uma lei que trate liberdade, responsabilidade e transparência na internet é tardio, mas paradoxalmente apressado. Sem qualquer debate mais aprofundado, eis que o governo e sua bancada no Congresso resolvem a toque de caixa aprovar uma lei cujos inúmeros dispositivos só agora, em cima da hora, foram colocados à luz.

A malograda tentativa sucumbiu em meio a pressão da sociedade. Sim, claro, também teve o lobby das bigtechs, que foram reprimidas pelo governo e judiciário. Mas, de fato, a retirada de pauta do PL 2630 fez ressurgir, no Congresso, a oposição ao governo Lula, encabrunhada desde a derrota nas urnas. Curiosamente, até o PSDB, antigo adversário do lulopetismo, mostrou às caras, encaminhou voto contrário a proposta e sapecou críticas duríssimas ao relatório apresentado em plenário.

E se a oposição despertou isso é um problema para o governo, porque não estamos falando apenas do bolsonarismo, mas uma agrupamento qualitativo e que tem capacidade de desconstruir nas redes e nas ruas o discurso governista, que terá de refazer as contas e os planos para as próximas pelejas, tanto na Câmara como no Senado. Esse certamente não era o cenário que Lula sonhava logo no inicio do seu governo, embora presumível diante do resultado apertado conferido pelas urnas.

O fato é que a liberdade de expressão é algo inegociável é cláusula pétrea da nossa Constituição Federal e qualquer proposta, por melhor que seja e que possa colocar em xeque nesse direito, precisa e deve ser debatida com profundidade, sem lobbys ou partidarismos. A criação de um órgão regulador, que será responsável por aferir a veracidade ou não de uma publicação ou conteúdo nas redes, por exemplo, é um ‘bode’ que foi colocado na ‘sala’ desse Projeto de Lei.

O argumento de que a “regulamentação da internet” ninguém pode se opor a menos que queira  espalhar desinformação e discurso de ódio é balela e só reproduz o velho, malfadado e carcomido discurso maniqueísta, do tipo nós contra eles. O tema precisa e deve ser debatido, mas da forma como está sendo conduzido, só alimenta desconfiaça e rejeição da própria sociedade. 
Aliás, num passeio na história, lembro que todos os defensores da censura disseram que só queriam acabar com as mentiras e o discurso perigoso. É nesse canto da sereia que toda tirania se apega para impor suas meias verdades ou mentiras completas.  

 

Compartilhe: