Discurso farsante; por Ivandro Oliveira

Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito em 2022 com a bandeira da defesa da democracia, em um discurso que mobilizou amplamente sua militância e atraiu setores que, temerosos diante de ameaças autoritárias, preferiram apostar no retorno do petista ao Planalto. Dois anos depois, o que se vê é a confirmação do que muitos já suspeitavam: o petismo continua sendo avesso à liberdade política quando ela não serve aos seus próprios interesses.

A recente entrega do Prêmio Nobel da Paz alternativo à venezuelana María Corina Machado escancarou, mais uma vez, essa incoerência. Machado, símbolo da resistência contra a ditadura de Nicolás Maduro, representa uma voz corajosa em defesa das liberdades fundamentais em uma nação vizinha em ruínas. O prêmio foi um reconhecimento à sua luta – e, por extensão, à de milhões de venezuelanos que resistem à tirania em busca de dignidade e liberdade.

Diante desse fato, esperava-se, no mínimo, um gesto público do presidente do Brasil, o líder de um país que abriga hoje cerca de 700 mil refugiados venezuelanos. Mas Lula e seu governo optaram pelo silêncio. Nem uma nota oficial, nem um tuíte protocolar, nada. A omissão é ruidosa e reveladora: quando se trata de denunciar violações de direitos humanos praticadas por governos aliados ideológicos, o petismo se cala ou, pior, relativiza.

O comportamento é vexatório. Um presidente que se apresenta como líder regional, defensor da integração sul-americana e das instituições democráticas, mas que se recusa a condenar abertamente um regime autoritário que persegue opositores, censura imprensa e manipula eleições, perde legitimidade moral. A hipocrisia não é nova – o apoio irrestrito a Cuba e à Nicarágua já era indicativo da seletividade petista quando o assunto é liberdade política.

Lula não ignora a situação da Venezuela. Sabe perfeitamente das prisões arbitrárias, da supressão de partidos e do exílio forçado de lideranças opositoras. Sabe que María Corina Machado foi impedida de disputar as eleições mesmo após vencer as primárias da oposição com mais de 90% dos votos. E mesmo assim, prefere preservar relações amistosas com o regime de Maduro a reconhecer, ainda que simbolicamente, a importância da luta democrática da ativista venezuelana.

O que sobra, portanto, é uma militância que repete mantras sobre “democracia” sem jamais demonstrar compromisso genuíno com seus princípios universais. A democracia, para o petismo, não é valor – é ferramenta. Serve enquanto pode ser usada para garantir poder. Mas se outros a reivindicam em nome da liberdade, da pluralidade ou do direito à oposição, passam a ser tratados como inimigos.

O silêncio de Lula diante do reconhecimento a María Corina Machado é mais do que uma omissão diplomática. É a exposição crua de uma farsa.

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