Pela primeira vez desde o início da série histórica do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), em 2022, o número de filhos nascidos de mulheres com 40 anos ou mais superou o de mães adolescentes no Brasil. O dado reflete transformações culturais, sociais e também o avanço da medicina reprodutiva.
Cada vez mais, mulheres optam por adiar a maternidade em nome da carreira, da estabilidade financeira e do amadurecimento pessoal. Paralelamente, a evolução de técnicas como o congelamento de óvulos, a fertilização in vitro (FIV) e o acompanhamento hormonal tem permitido mais segurança para quem decide engravidar tardiamente.
“A confiança na ciência deu às mulheres liberdade frente ao ‘relógio biológico’”, afirma a embriologista paraibana Salomé Espínola, especialista em reprodução assistida.
Apesar da tendência, ainda são escassas as estatísticas que indicam quantas mulheres adiam a gravidez exclusivamente por razões profissionais ou acesso à tecnologia médica. No entanto, clínicas de fertilidade relatam crescente procura de mulheres entre 30 e 38 anos interessadas em preservar a fertilidade — muitas delas solteiras.
A partir dos 35 anos, a fertilidade feminina começa a cair mais rapidamente. Os óvulos envelhecem junto com o corpo, apresentando menor taxa de implantação e maior incidência de alterações genéticas — o que pode comprometer tanto a gravidez natural quanto os tratamentos por FIV.
“A embriologia moderna pode colaborar com esse cenário, seja na seleção de embriões com maior potencial de sucesso ou com pesquisas promissoras em biorregeneração gonadal”, diz Salomé.
A biorregeneração gonadal busca restaurar ou melhorar a função dos ovários ou testículos por meio de terapias celulares e moleculares — uma esperança para pacientes com infertilidade causada pela idade, doenças autoimunes ou tratamentos oncológicos.
Segundo a especialista, a taxa de sucesso da FIV com óvulos próprios em mulheres com mais de 40 anos é bem inferior à obtida com óvulos doados. “A recomendação de uso de óvulos doados é comum após os 42 anos, mas o congelamento ainda é uma alternativa viável para mulheres que ovulam regularmente e respondem bem à estimulação hormonal”, explica.
Salomé conclui: “A maternidade não perdeu seu valor. O que mudou foi a forma como as mulheres escolhem vivê-la — com mais liberdade, responsabilidade e informação”.

QUEM É DRA SALOMÉ
Bióloga com doutorado e pós-doutorado em Endocrinologia e Medicina Molecular, com ênfase em Embriologia Humana e Reprodução Assistida.
Atua na Clínica Art Fértil – PE como responsável pelos exames diagnósticos da infertilidade masculina, incluindo espermograma, capacitação espermática, fragmentação do DNA espermático e aconselhamento em preservação da fertilidade (criopreservação de espermatozoides, óvulos e embriões) para pacientes oncológicos e não oncológicos. Também integra o Laboratório Análisis, referência em diagnóstico seminal avançado.
Atualmente é pós-doutoranda em Biotecnologia aplicada à Embriologia Humana no System Biology Group da Università degli Studi di Roma La Sapienza – considerada a maior universidade da Europa e um dos principais centros acadêmicos do mundo.
Foi professora nos cursos de Graduação e Pós-Graduação da Università La Sapienza, Instituto Oncológico Regina Elena e Instituto San Gallicano (dois dos maiores centros de pesquisa oncológica e dermatológica da Itália), além da Università San Raffaele em Roma.
É membro fundadora da World Society of Gonadal Biorregeneration, sociedade internacional voltada ao avanço de terapias regenerativas aplicadas às gônadas (ovários e testículos). Também integra o EGOI – Grupo Internacional Multidisciplinar de Especialistas em Inositol, formado por pesquisadores de 14 países com foco em aplicações clínicas dos inositóis, especialmente no tratamento da Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) e suporte à fertilização in vitro (FIV).