Ministros voltam a se atacar em sessão do Supremo Tribunal Federal

A troca de acusações entre os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, nesta quarta-feira, é mais um episódio dos embates entre os integrantes do Supremo Tribunal Federal. De perfis opostos, os ministros já provocaram momentos de tensão no plenário da Corte, com direito a críticas diretas e bate-boca durante julgamentos.

Veja a seguir os episódios:

TROCA DE FARPAS PELA IMPRENSA

O episódio mais recente da troca de acusações ocorreu nesta quarta-feira. Gilmar disse ao blog jornalista Andréia Sadi, do G1, que Barroso “fala pelos cotovelos” e “precisa suspender a própria língua”:

— O Barroso que não sabe o que é alvará de soltura, fala pelos cotovelos. Antecipa julgamento. Fala da malinha rodinha. Precisaria suspender a própria língua — afirmou.

Barroso respondeu por meio de nota, na qual fez referência aos frequentes encontros — muitos deles fora da agenda — entre Gilmar e o presidente Michel Temer, assim como a proximidade dele com políticos investigados, como o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

“Jamais antecipei julgamento. Nem falo sobre política. Eu vivo para o bem e para aprimorar as instituições. Sou um juiz independente, que quer ajudar a construir um país melhor e maior. Acho que o Direito deve ser igual para ricos e para pobres, e não é feito para proteger amigos e perseguir inimigos. Não frequento palácios, não troco mensagens amistosas com réus e não vivo para ofender as pessoas”, escreveu Barroso.

DIVERGÊNCIA DE OPINIÃO

Em junho, durante o julgamento da delação da JBS, o clima azedou entre os dois ministros, que têm posições diferentes sobre as regras das delações premiadas. Gilmar chegou a deixar o tribunal após a discussão com Barroso, antes de a sessão terminar.

‘Essa é a opinião de Vossa Excelência. Deixe os outros votarem’

– GILMAR MENDES Ministro do STF

Barroso, que votou com a maioria pela manutenção da forma como as colaborações são feitas, reagiu irritado quando Gilmar o acusou de não respeitar posições divergentes.

— Essa é a opinião de Vossa Excelência. Deixe os outros votarem — exaltou-se Gilmar.

— Sim, mas está todo mundo vontando — respondeu Barroso.

— Claro. E respeite o voto dos outros — reagiu Gilmar.

‘Não pode: acho que vou perder e vou embora. Não! Estamos discutindo’

– LUÍS ROBERTO BARROSOMinistro do STF

— Claro, vou plenamente respeitar os votos dos outros. Estou ouvindo Vossa Excelência. Inclusive foi Vossa Excelência que ontem suscitou: a questão não é só essa, temos outras considerações. E em consideração à de Vossa Excelência, eu trouxe a minha. Agora não pode: acho que vou perder e vou embora. Não! Estamos discutindo — devolveu Barroso.

ATAQUES DIRETOS

Em outubro, quando o STF analisava uma emenda à Constituição que extinguiu o Tribunal de Contas do Municípios do Ceará, Gilmar e Barroso protagonizaram uma discussão com ataques diretos, que manteve os outros ministros em silêncio. A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, até tentou apaziguar os ânimos, mas as acusações continuaram. Ela, então, encerrou a sessão.

O bate-boca começou quando Gilmar ironizou a situação do Rio de Janeiro, dizendo que o estado não era podia ser tomado exemplo. Barroso, que é natural do Rio, não gostou e reagiu, afirmando que o colega “não trabalha com a verdade”, “muda de jurisprudência de acordo com o réu” e tem parceria com “a leniência em relação à criminalidade do colarinho branco”. Na tréplica, Gilmar acusou Barroso de ter advogado para “bandidos internacionais”.

‘Vossa Excelência, quando chegou aqui, soltou José Dirceu’

– GILMAR MENDESMinistro do STF

— Gente, citar o Rio de Janeiro como exemplo… — disse Gilmar.

— Eles devem achar que é Mato Grosso, onde está todo mundo preso — rebateu Barroso, mencionando o estado de origem de Gilmar.

— No Rio, não estão (presos)? — questionou Gilmar.

— Aliás, nós prendemos, tem gente que solta — prosseguiu Barroso.

— Solto cumprindo a Constituição. Vossa Excelência, quando chegou aqui, soltou José Dirceu — afirmou Gilmar.

‘Vossa Excelência está ocupando tempo do plenário com um assunto que não é pertinente para destilar esse ódio constante que Vossa Excelência tem e agora o dirige contra o Rio’

– LUÍS ROBERTO BARROSOMinistro do STF

— É mentira. Aliás, Vossa Excelência normalmente não trabalha com a verdade. Gostaria de dizer que José Dirceu foi solto por indulto da presidente da República. Vossa Excelência está fazendo um comício que não tem nada que ver com o Tribunal de Contas do Ceará. Vossa Excelência está queixoso porque perdeu o caso dos precatórios e está ocupando tempo do plenário com um assunto que não é pertinente para destilar esse ódio constante que Vossa Excelência tem e agora o dirige contra o Rio. Vossa Excelência deveria ouvir a última música do Chico Buarque. “A raiva é filha do medo e mãe da covardia”. Vossa Excelência fica destilando ódio o tempo inteiro. Não julga, não fala coisas racionais, articuladas. Sempre fala coisas contra alguém, sempre com ódio de alguém, com raiva de alguém — declarou Barroso.

No dia seguinte, Barroso reconheceu que se exaltou no plenário, mas não considerou que “tenha passado da linha”.

CRÍTICAS E DESABAFOS

Um novo embate ocorreu no dia 19 de dezembro, quando o STF discutia questões relacionadas a investigações contra políticos. Depois que Gilmar criticou o ex-procurador-geral Rodrigo Janot, Barroso reagiu dizendo “vivemos uma tragédia brasileira, a tragédia da corrupção que se espalhou de alto a baixo sem cerimônia”.

‘Criamos um monstro (o MP). E o pior: investigação mal feita. Um vexame institucional completo de gente que não sabe investigar e foi investido por nós desse poder.’

– GILMAR MENDESMinistro do STF

— Criamos um monstro (o Ministério Público). E o pior: investigação mal feita. Juntam áudio e não pede, perícia. Um vexame institucional completo de gente que não sabe investigar e foi investido por nós desse poder. É uma grande bagunça, um grande caos, com corta e cola, contradições apontadas. Isso é vexaminoso para o tribunal e temos obrigação de definir minimamente para que isso não prossiga — reclamou Gilmar, acrescentando: — O populismo judicial é responsável por esse tipo de assanhamento criminal. A história não vai nos poupar. A covardia com que tratamos os temas vai ser cobrada.

Barroso rebateu:

— Eu não acho que há uma investigação irresponsável. Há um país que se perdeu pelo caminho, naturalizou as coisas erradas, e nós temos o dever de enfrentar isso e de fazer um novo país, de ensinar as novas gerações de que vale a pena fazer honesto, sem punitivismo, sem vingadores mascarados, mas também sem achar que ricos criminosos têm imunidade. Porque não têm. Tem que tratar o menino pego com 100 gramas de maconha da mesma forma que se trata quem desvia milhões de reais — afirmou.

‘Há diferentes formas de ver a vida e todas merecem consideração e respeito. Eu gostaria de dizer que eu ouvi o áudio ‘Tem que manter isso aí, viu’. Eu quero dizer que eu vi a fita, eu vi a mala de dinheiro, eu vi a corridinha na televisão.’

– LUÍS ROBERTO BARROSOMinistro do STF

Na sequência, Barroso fez um desabafo:

— Há diferentes formas de ver a vida e todas merecem consideração e respeito. Eu gostaria de dizer que eu ouvi o áudio “Tem que manter isso aí, viu”. Eu quero dizer que eu vi a fita, eu vi a mala de dinheiro, eu vi a corridinha na televisão. Eu li o depoimento de Youssef. Eu li o depoimento de Funaro.

E continuou:

— Portanto nós vivemos uma tragédia brasileira, a tragédia da corrupção que se espalhou de alto a baixo sem cerimônia. Um país em que o modo de fazer política e negócios funciona assim. O agente político relevante escolhe o diretor da estatal ou ministro com cotas de arrecadação. E o diretor da estatal contrata em licitação fraudada a empresa que vai superfaturar a obra ou o contrato público para depois distribuir dinheiros.

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